segunda-feira, agosto 22, 2011

DIREITOS E OBRIGAÇÕES DOS SEXOS


          Só quando os eixos “homem-mulher”, “masculino-feminino” e “maternal-paternal” forem reconhecidos em sua autonomia, merecendo, cada um deles, uma abordagem em separado para, após isso, analisarem-se suas interações, poderá a questão dos direitos e obrigações de homens e mulheres ser devidamente aproximada.

O quadro abaixo põe a claro uma obviedade frequentemente descuidada e que abordei en passant, em meu artigo “Elisabeth Badinter e a Idealização da Maternidade”, postado neste saite.  Com efeito, o quadro explicita como em vez de DUAS CATEGORIAS, que vão no quadro sombreadas  – o homem masculino e paternal e a mulher feminina e maternal – há OITO CATEGORIAS a serem devidamente respeitadas para que uma adequada aproximação da matéria se torne viável.  Vejamos:


HOMEM
MULHER
MASCULINO
FEMININO
MASCULINA
FEMININA
Paternal
Maternal
Paternal
Maternal
Paternal
Maternal
Paternal
Maternal
1
2
3
4
5
6
7
8

Nossa cultura ainda não exige a organização de um “movimento masculista” (vai, é claro, acabar exigindo), mas o “movimento feminista”, que já se fez necessário, ficará à deriva, enquanto não reconhecer a realidade das oito categorias que o quadro expõe. 

Isso não parece suficientemente explicitado na defesa da mulher, não obstante o quanto meritória, levada adiante por Badinter.

domingo, agosto 21, 2011

LOJA DE CONVENIÊNCIAS

Entrei em uma loja de conveniências para comprar sei-lá-o-quê.  A atendente estava dando o troco para um senhor.  O diálogo que se seguiu é real e foi presenciado por quem estava comigo.  Perguntei, sem que ela tivesse dito mais do que duas ou três palavras:

CÉSAR:  "Você é ariana?"
VENDEDORA:  "Sim, sou de Áries!"
CÉSAR:  "Nasceu às 6 horas da manhã?"
VENDEDORA:  "Exatamente às 6 horas da manhã!"

O diálogo tem saborosíssimo epílogo, mas vale, antes, comentar o fragmento transcrito.

Como pude supor que a moça, de seus vinte e poucos anos, era ariana e, logo em seguida, desconfiar que nascera às 6 da manhã? Para um astrólogo experimentado, não haverá surpresa. Para os leigos na matéria, há de parecer milagre.

Explico o "milagre". 

Supostamente, dar um troco é um gesto de cortesia, que devolve a de nos haverem comprado algo que desejávamos vender. A atendente não devolveu o troco - aliás, eram moedas - estendendo-o às mãos do cliente, cuja expressão facial não apresentava qualquer sinal de, anteriormente à minha entrada na pequena loja, haver ocorrido algum conflito entre ambos.  Não.  Ela não devolveu simplesmente o troco. Ela bateu com a mão cheia de moedas sobre o balcão, fazendo característico ruído, e deixando-as ali, para que o freguês as alcançasse.

Não era a gentil devolução de um troco, como tipicamente caberia a um venusiano sujeito de Touro ou Libra.  Aquilo era uma aberta - não obstante microscópica - declaração de guerra. 

Guerra abertamente declarada[1]?  Igual = Áries!

Mas não foi isso só.  Quando me confirmou seu signo, a vendedora - eu ia dizer "nossa vendedora", mas imaginei que um ariano não gostaria de tais intimidades - fê-lo com um tom que matizava com especial adendo as entrelinhas de sua resposta:  "E por quê?  Algum problema?"  Não.  Não era ariana.  Era  MUITO ARIANA.  Ora, MUITO ARIANA = Sol e ASCENDENTE em Áries.  Ora, SOL E ASCENDENTE no mesmo signo, seja, nascimento ao nascer do Sol, seja (em nossa latitude),  nascimento por volta de seis horas da manhã.  Bingo!

Tudo muito interessante do ponto de vista de aquilatarmos o poder de previsão que nos empresta o conhecimento astrológico, mas, para mim, que já de muito visito esse poder, não tão saboroso quanto o epílogo dessa cena. 

Assentada, naturalmente, no aforismo inglês "it takes one to know one"[2], a moça me inquiriu:

ATENDENTE:  - Por quê?  VOCÊ TAMBÉM - nunca SENHOR, é claro, embora eu tenha 67 anos e ela, no mínimo, quarenta anos a menos do que eu - É DE ÁRIES?

E perguntou-me isso com já embrionário orgulho de mim, outro possível representante daquela alta estirpe cósmico-militar.

CÉSAR:  "Não, sou astrólogo." - respondi, com taurina placidez.

VENDEDORA:  Ah...!  - retorquiu, com visível desprezo, rebaixando minha estirpe para a dos serviçais científicos da sua...

Saint Exupéry, em seu magnífico Terre des Homes, transcreve um poema, nascido entre os tuaregues, após finda a guerra de independência da Argélia, durante a qual se enfrentaram duramente com os franceses, finalmente expulsos dali [3]. 

Repasso de memória o espírito do texto, com as previsíveis distorções de sua letra:

"O que será de mim agora, sem você,
Meu inimigo?
Antes, era você quem guiava
Meus passos pelo deserto,
Onde, por trás de cada duna,
Você poderia estar a espreita de mim.
Agora vago, sem destino,
Sem saber para onde olhar
Nem por onde caminhar..."

Você quer um amigo ariano?  Apresente-se como seu inimigo.
______________

[1]  Abertamente declarada.  Fosse um Escorpião, e a disposição para a batalha seria vista, não no gesto, mas na natureza do olhar;
[2]  Livremente:  "só um igual para reconhecer seu igual"!
[3]  Na verdade, não pelos combatentes argelinos, mas pela pressão do povo francês sobre o governo de De Gaulle, que, em confronto aberto com a direita militar e os colonos franceses, acedeu à pressão popular, engenhando, em 1959, o plebiscito que levou à independência da ex-colônia, oficialmente reconhecida em 1962.




sábado, agosto 20, 2011

sexta-feira, agosto 19, 2011

TRÂNSITOS DOS SUPERLENTOS



Só para os entendidos:  os trânsitos de Plutão mexem com o porão; os de Urano, com o térreo; os de Netuno, com o sótão.  Outra variação:  chafurdar; fazer acrobacias; transcender.

segunda-feira, agosto 15, 2011

DAR O CU COMO FORMA DE PROTESTO

Todo o mundo vai adivinhar o desenvolvimento do diálogo.  Estava-se falando, num grupo sobre o suposto absurdo de se eleger o Tiririca como deputado federal.  Alguém vociferou:
"Foi uma forma de protesto!"
Aditei:
"Claro, poder-se-ia chamar isso de DAR O CU COMO forma de protesto!"
Perguntaram-me:
"Você é CONTRA?"
Continuei:
"De forma alguma.  Na verdade, demos um "jeitinho" de suavizar o protesto japonês do harakiri e o budista de incendiar-se vivo no protesto mais suave de DAR O CU, ou, melhor, de DAR O VOTO, o que, aparentemente, tem até mais efeito."
Retorquiram:
"Como assim?"
Estendi-me:
"Bem, num total, Tiririca, à maneira de seus colegas, custa 250 mil reais por mês a nosso erário, sendo que, se reeleito, fará jus (!!!), após oito anos, a aposentadoria integral vitalícia.  Ora, a partir de sua eleição, com que nos agraciou São Paulo, inciou-se ali mesmo um movimento pela implementação do voto distrital (vide www.euvotodistrital.org.br), que, instaurado, impediria o alçamento ao Congresso, na esteira de um aproveitador sincero, de mais quatro - e certamente mais malignos - aproveitadores ocultos.  Ora, uma Psicanálise de um só sujeito é cara, por que não seria cara a de milhões de eleitores brasileiros que, a partir de Tiririca, começam a experimentar o insight de que os palhaços são eles???"



domingo, agosto 14, 2011

TEÍSTAS E ATEUS

Você crer que deus existe ou não existe não é problema:  problema é você acreditar que basta sua crença para que ele, de fato, exista ou não exista. 

GENERAIS E SACERDOTES

Na guerra, só duas coisas são indispensáveis:  um general para mandar você para a morte e um sacerdote para convencê-lo de que você vai continuar vivendo após ter morrido.

quinta-feira, agosto 11, 2011

O PESCADOR DE ESTRELAS


Dormita na praia o pescador de estrelas.  A culpada foi a noite que, de tão bela, lhe trouxera novamente sua velha solidão inesquecível.  Assim, embalado pelo marulhar das ondas, ele adormece, protegendo com cuidado os astros que pescara.  Quanto tempo passou assim?  Como saber?  Apenas, ia já a Lua alta, quando, sacudido pela força de um perfume, ele estremece ao roçar de alguns cabelos.  Abre os olhos.  Quem era?  E que importa?  Entendem-se num olhar...  Ele oferece-lhe as estrelas.  Depois de fitá-las largamente e com um olhar profundo, ela faz um sorriso e, com carinho, coloca-as entre os seios...  Juntos, deitam-se na praia.  A mansidão morna da noite envolve-os como a compreensão de um velho pai.  E um silêncio enorme, qual o bocejo de um gigante, prolonga-se pelo céu, estende-se sobre o mar e, rolando na crista das ondas, chega preguiçosamente às areias.  A noite cheira à suavidade penetrante de um perfume oriental.
Sozinhos.  Ele, de olhos fixos naqueles cabelos cor de ouro, que a Lua não faz que pratear, pela primeira vez esquece passado e futuro e saboreia fartamente o gosto simples do presente ...
 À mesma hora, na noite seguinte, ela voltou.  Sentou-se com os pés ao alcance das ondas.  Curiosa, esperava que ele mergulhasse as mãos nas algibeiras e trouxesse de volta uma pequena multidão de luzes.  Como crianças, brincavam:  derramavam as estrelas sobre si e corriam, corriam, deixando-as cair sobre as areias, para serem acariciadas pelo mar...
Assim foi.  Assim é até hoje:  encontram-se na praia;  ele troca com ela os astros que pescou.
Amanhã será assim?  Como saber?  Na verdade, nem ele sabe ao certo quem são aqueles cabelos, que, sob a Lua, lhe recordam o Sol, e aqueles olhos verdes, que se confundem com o mar.  Na verdade, ele nunca lhe perguntou se ela virá amanhã,  ela tampouco.  Talvez o melhor de tudo seja a certeza de que pouco lhes importa toda a incerteza. 
De tudo?  Não.  O melhor de tudo é ele ter podido, um dia, compartilhar com alguém as estrelas que pescou.

Rio de Janeiro, 15/03/1963

sexta-feira, agosto 05, 2011

CASTRAÇÃO QUÍMICA

Enviaram-me, via Internet, a seguinte pergunta:  “Qual o tratamento que deve ser dado a um pedófilo e quando a castração química seria uma opção?”

Bem, antes de tudo, cabe perguntar se há sentido em se “tratar” um pedófilo.

Minha resposta a essa pergunta é a seguinte:  se ele sofrer com sua condição, o atendimento psicoterápico é claramente indicado (se bem que, em se tratando de um psicopata, não é difícil que se tome por real um sofrimento meramente simulado);  se concretiza seus impulsos pedofílicos e se compraz em fazê-lo, as medidas a serem tomadas deverão ser essencialmente jurídico-penais, e apenas secundariamente terapêuticas. 
Mas voltemo-nos sobre os casos em que o tratamento é indicado e, em particular, ao tipo de tratamento sobre o qual fui inquirido:  a “castração química”.

Para começar, consideremos o que é castração química. A mais aceita atualmente é a realizada com a aplicação do medicamento Depo-Provera (acetato de medroxyprogesterona), uma versão sintética da progesterona (o hormônio feminino pró-gestação), que inibe a produção de testosterona, reduzindo o apetite sexual exacerbado não apenas dos pedófilos, mas dos sex-offenders em geral.  Os efeitos colaterais negativos mais frequentes da aplicação do Depo-Provera são: depressão, fadiga crônica, aumento da agressividade, diabetes e alterações no processo de coagulação sanguínea.  Ainda assim, há os que consideram que os benefícios em termos de adaptação social superam a negatividade desses efeitos colaterais.

Leve-se, em conta, não obstante, que a castração química só diminui a intensidade da libido, mas não altera a personalidade básica do sujeito. Como disse em entrevista à BBC, Donald Findlater, um porta-voz da organização britânica Lucy Faithful foundation, dedicada à proteção de crianças e adolescentes: "Os medicamentos não vão impedir que alguém que seja interessado sexualmente por crianças deixe de sê-lo", devendo ser, portanto, qualquer ação medicamentosa acompanhada de socorro psicoterápico.  Essa ação psicoterápico-medicamentosa tem efeito comprovadamente mais eficaz (redução de reincidência de 75%) do que o encarceramento que, uma vez terminado, leva apenas o pedófilo a exercer sua compulsão com maior prudência, com vistas a evitar novo encarceramento (redução de reincidência de apenas 2%).  Note-se, contudo, que a castração com o Depo-Provera não é, em princípio, definitiva. O molestador tem que se apresentar sempre ao médico legalmente designado para continuar tomando as injeções no prazo indicado, sem as quais os testículos poderão até mesmo aumentar a produção de testosterona acima dos níveis anteriormente verificados, com a acentuação obviamente correspondente da libido.

Por outro lado, a aplicação da castração química levanta, naturalmente, questões ético-jurídicas.  No Brasil, no ano de 2002, o deputado Wigberto Tartuce (PPB-DF), apresentou o projeto de lei 7.0212, que defendia a pena de castração, feita com recursos químicos, para quem cometesse o crime de estupro. O projeto não foi aprovado. Na Itália, apresentou-se projeto de lei análogo, com uma diferença fundamental: os italianos defendem a idéia de que A CASTRAÇÃO QUÍMICA SOMENTE PODERIA SER APLICADA COM O CONSENTIMENTO DO CONDENADO (que, se não consentir, cumpre a pena de prisão normalmente).  De meu ponto de vista, o projeto italiano é moralmente defensável; o brasileiro, não. 

Fico à disposição no que diz respeito a outros questionamentos sobre a matéria.